sexta-feira, 15 de maio de 2020

Flexibilizaão do Pagamento de Aliuguel nos contratos de Locação durante a pandemia do Coronavírus


Por Arthur Ribeiro Mesquita, do núcleo de Direito Imobiliário, Urbanístico e Condominial do IEAD
Desde a chegada do novo coronavírus (COVID-19) no território brasileiro, a população observa, diariamente, a evolução do número de infectados e de vítimas fatais, sem saber exatamente o que ainda está por vir.
Neste sentido, é evidente que o setor imobiliário e as relações contratuais estão sendo bastante afetados pelos impactos financeiros causados pela pandemia do COVID-19, o que necessariamente repercute nos contratos de locação residenciais e comerciais (não residenciais). Inclusive, o mercado imobiliário prevê que o índice de inadimplência em contratos de aluguel pode chegar ao percentual de 30% nos próximos meses[1], devido à diminuição da renda dos locatários e a consequente dificuldade em pagar o aluguel em dia.
Diante deste atual cenário, quais são as opções jurídicas para locatários e locadores contornarem a crise e não rescindirem o contrato de locação? Trata-se de uma questão bastante complexa e não há uma única solução para todas as situações, tendo que ser feita uma análise caso a caso. Porém, algumas orientações gerais podem ser repassadas, de modo a tentar amenizar uma possível crise financeira e imobiliária no futuro.
Em primeiro lugar, é importante destacar que a atual situação de crise econômica, por si só, não autoriza o locatário a deixar de pagar os aluguéis pontualmente. Inclusive, o locatário cuja renda não foi muito prejudicada pela pandemia deve continuar pagando o preço previsto no contrato, nos prazos estipulados, sem nenhuma alteração.
Em relação aos locatários que tiverem a sua renda cortada ou drasticamente reduzida pelos efeitos econômicos do COVID-19, a sugestão é que procurem o locador do seu imóvel o mais rápido possível, para informá-lo a respeito da sua situação financeira e tentar compor um acordo amigável, cumprindo com os deveres de informação e transparência, inerentes ao princípio da boa-fé contratual, previsto no artigo 422 da Lei nº 10.406/02 (Código Civil).
Independentemente de se tratar de uma locação residencial ou comercial, o acordo extrajudicial é a medida mais recomendada para os locatários e locadores, tendo em vista que um processo judicial pode ser extremamente oneroso e demorado, enquanto que a conciliação trará resultados imediatos.
Inclusive, já se fala em um “dever de renegociar” como condição para ingressar na via judicial[2], teoria desenvolvida pelo nobre doutrinador Anderson Schreiber, a qual prega que a prévia tentativa de negociação entre os contratantes deve ser considerada um pré requisito para propor ação judicial de revisão de contratos. Mais do que isso, a tentativa de negociação representa uma atitude de boa-fé, que pode ser levada em consideração pelo magistrado em um possível processo judicial no futuro.
Para se fazer uma boa negociação e chegar a um consenso, existem algumas dicas que devem ser observadas. De início, destaca-se que não é recomendável que as partes cheguem a um acordo apenas no “boca a boca”, sendo aconselhável que o acordo seja feito por escrito, de preferência por um termo aditivo ao contrato de locação, para dar segurança jurídica e evitar futuras discordâncias.
Além do mais, é importante ter em mente que os descontos auferidos durante a quarentena devem ser ressarcidos ao locador no futuro, em número de parcelas a ser combinado entre as partes, uma vez que o proprietário do imóvel não pode arcar sozinho com a redução do valor do aluguel.
Após as tratativas de negociação, é possível que as partes não cheguem a um denominador comum, frustrando a expectativa de acordo. Diante dessa situação, o locatário pode optar pelo ajuizamento de sua demanda, explorando as possibilidades jurídicas do ordenamento brasileiro.
Tomando por base a Lei nº 8.245/1991, também conhecida como Lei do Inquilinato, esta somente prevê a revisão judicial do valor do aluguel após três anos de contrato, com o objetivo de adequar o preço ao valor de mercado, nos termos do artigo 19 da referida Lei. Para os locatários que se encontram nesta hipótese, pode ser um bom argumento a ser utilizado na ação revisional.
Entretanto, a Lei do Inquilinato não prevê expressamente a revisão contratual por fatores imprevisíveis, como o que vem acontecendo no momento, razão pela qual o locatário deve socorrer-se ao Código Civil e às construções doutrinárias e jurisprudenciais.
Neste sentido, as teorias da imprevisão, da onerosidade excessiva e do caso fortuito e força maior, previstas, respectivamente, nos artigos 317478 e 393 do Código Civil, se mostram como os melhores artifícios para convencer o magistrado a revisar o contrato e reduzir os valores dos aluguéis. Os três institutos mencionados foram construídos a fim de mitigar o princípio da força obrigatória dos contratos (pacta sunt servanda) diante de situações excepcionais que causam o desequilíbrio contratual, como é o caso do coronavírus e seus efeitos na sociedade.
Destaca-se que, em juízo, não basta alegar a crise do COVID-19 como um fato público e notório (artigo 374, inciso I do Código de Processo Civil), mas também é necessário provar e demonstrar ao juiz a queda de rendimentos da empresa (em caso de locação comercial) ou a redução do salário da pessoa física (em caso de locação residencial).
Ainda é muito cedo para fazer uma análise jurisprudencial profunda sobre o tema. Porém, até o momento, a jurisprudência majoritária tem optado por não deferir as medidas liminares requeridas por locatários, que pretendem que o juiz imponha a redução do valor do aluguel durante o período de quarentena.
Por outro lado, os Tribunais brasileiros também têm optado por não despejar inquilinos devedores neste atual momento de adversidade, até porque a recomendação é de que as pessoas permaneçam em casa e não saiam nas ruas. Neste sentido, o Projeto de Lei nº 1.179/2020, em trâmite no Congresso Nacional, estabelece um regime de urgência para as relações privadas e, em seu artigo 9º, determina a suspensão das desocupações forçadas em ações de despejo, o que se aplicaria para os processos ajuizados entre 20 de março de 2020 até 30 de outubro de 2020, caso o projeto seja aprovado no Congresso.
Portanto, diante da ausência de uma lei específica e da imprevisibilidade da economia, os órgãos judiciários, em sua maioria, não querem tomar decisões precipitadas por agora, seja impondo a redução forçada do valor do aluguel ou despejando inquilinos devedores, mais uma razão para que locadores e locatários coloquem suas diferenças de lado e busquem resolver seus problemas por meio da conciliação.

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